Segundo a ficha técnica do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA, (UNEP_SDG_FactSheet_March13_2015), a poluição química, em todas as suas formas (ar, água, solo, alimentos, etc), constitui a principal causa de morte em todo o mundo atualmente. Em virtude da falta de informação, treinamento, regulamentação, fiscalização e outras medidas de prevenção e controle, cerca de 94% dessas mortes concentram-se nos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, como o Brasil.
Esses fatos justificam as numerosas iniciativas internacionais para melhorar a gestão dos produtos químicos em todos os países, lideradas pela ONU e por outros organismos internacionais e regionais. Além disso, alertam para a prioridade que as ações no campo da Segurança Química devem receber no país, oitavo produtor químico e maior consumidor de agrotóxicos no mundo.
Química Verde
Definida como um conjunto de 12 princípios que, quando usado no projeto, desenvolvimento e implementação de produtos e processos químicos, permite aos cientistas proteger e beneficiar a economia, as pessoas e o planeta, abrangendo:
- Prevenção: evitar a formação de resíduos tóxicos;
- Eficiência Atômica: incorporar o maior número possível de átomos dos reagentes no produto final;
- Síntese Segura: metodologias sintéticas que utilizam e geram substâncias com pouca ou nenhuma toxicidade à saúde humana e ao ambiente;
- Desenvolvimento de Produtos Seguros: produtos que não causem danos ao ambiente;
- Uso de Solventes e Auxiliares Seguros: utilização de substâncias auxiliares inócuas ou facilmente reutilizáveis como solventes, agentes de purificação e secantes;
- Busca pela Eficiência de Energia: desenvolvimento de processos que ocorram à temperatura e pressão ambientes;
- Uso de Fontes de Matéria-Prima Renováveis: uso de biomassa como matéria prima deve ser priorizado;
- Evitar a Formação de Derivados: evitar processos que envolvem intermediários com grupos bloqueadores, proteção/desproteção, ou qualquer modificação temporária da molécula;
- Catálise (Seletividade): em substituição aos reagentes estequiométricos;
- Produtos Degradáveis: biocompatibilidade; não devem permanecer no ambiente, degradando-se em produtos inócuos;
- Análise em Tempo Real para a Prevenção da Poluição: possibilidade de formação de substâncias tóxicas deverá ser detectada antes de sua geração; e
- Química Intrinsecamente Segura para a Prevenção de Acidentes: minimização do risco de acidentes, como vazamentos, incêndios e explosões.
O objetivo final da Química Verde é reduzir, fisicamente, as quantidades de produtos químicos com impacto negativo na saúde humana e no meio ambiente.
Química Sustentável
Definida pela Agência Federal Alemã de Meio Ambiente como a parte da Química essencial para uma sociedade sustentável, com uma visão do design do produto, fabricação, consumo de recursos, saúde e segurança no trabalho, sucesso econômico e inovação tecnológica, em países industrializados, emergentes e em desenvolvimento. A Química Sustentável enfatiza a dimensão social da sustentabilidade e possui numerosas submetas reunidas em 4 grupos de metas, descritos a seguir:
- G1- Aumento geral da eficiência dos recursos.
- G2- Redução dos efeitos adversos dos produtos químicos na saúde humana e no ambiente.
- G3- Aumento do valor econômico e fortalecimento da gestão química.
- G4- Aumento da sustentabilidade em sistemas no entorno.
Programa Interorganizacional para o Gerenciamento Efetivo de Produtos Químicos
The Inter-Organization Programme for the Sound management of Chemicals – IOMC
O Programa Inter-Organizacional para o Gerenciamento de Produtos Químicos (IOMC) foi criado em 1995, para fortalecer a cooperação e aumentar a coordenação no campo da Segurança Química. A partir de 2002, passou a constituir o mecanismo balizado para iniciar, facilitar e coordenar a ação internacional para alcançar a Meta 2020, estabelecida na Rio +10, em Joanesburgo, de que os produtos químicos devem ser produzidos e utilizados de forma a minimizar seus impactos adversos significativos na saúde humana e no ambiente até 2020, em todos os países.
Abordagem Estratégica Internacional para a Gestão das Substâncias Químicas
The Strategic Approach to International Chemicals Management (SAICM)
A Meta 2020 está no núcleo da Abordagem Estratégica Internacional para a Gestão de Substâncias Químicas (SAICM), estrutura política criada em 2006, por ocasião da Primeira Conferência Internacional de Gestão de Substâncias Químicas (ICCM1).
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável – ODS
Em 25 de setembro de 2015, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), no âmbito da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável abrangem um conjunto novo e universal de metas, objetivos e indicadores que os Estados Membros da ONU devem usar ao elaborar suas agendas e políticas nos próximos 15 anos.
O mandato da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (UNIDO) é promover o desenvolvimento industrial inclusivo e sustentável para alcançar a prosperidade compartilhada e a sustentabilidade ambiental. Embora particularmente ligado ao ODS 9: “Construir uma infraestrutura resiliente, promover a industrialização inclusiva e sustentável e promover a inovação”, a UNIDO esforça-se por vincular suas prioridades com todos os 17 ODS, a fim de garantir que seus programas, projetos e iniciativas tenham efeitos sinérgicos positivos no apoio à consecução de todos os objetivos da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
Economia Circular
Em 2 de dezembro de 2015, a Comissão Europeia aprovou um ambicioso Plano de Ação para estimular a transição da Europa para uma Economia Circular que visa “impulsionar a competitividade global, promover o crescimento econômico sustentável e gerar novos empregos”. A Economia Circular é caracterizada por uma economia restauradora e regenerativa que visa manter produtos, componentes e materiais com maior utilidade e valor agregado em todo o ciclo de vida. Surge em contraposição à Economia Linear, cujas limitações principais são a exaustão dos recursos naturais e a poluição ambiental em todas as formas.
Outras Iniciativas
A Assembleia das Nações Unidas para o Meio Ambiente 2 (UNEA-2), realizada em 23 de maio de 2016, em Nairobi, mencionou a Química Sustentável como um importante componente da gestão efetiva de produtos químicos.
A implementação do Protocolo de Montreal e das Convenções de Estocolmo, Basileia, Roterdã e Minamata contribuem ainda mais para os objetivos do SAICM e relaciona-se com a importância da ação política conjunta para prevenção, redução, remediação, minimização e eliminação de riscos durante o ciclo de vida dos produtos químicos.
Chemical Leasing
A crescente produção química mundial constitui uma progressiva ameaça à saúde humana e ao meio ambiente, uma vez que a exposição global é proporcional à quantidade utilizada. O motor deste crescimento é o lucro proporcional à quantidade comercializada, de modo que, quanto mais produtos químicos são vendidos, maior é o benefício econômico do fornecedor, uma dinâmica que geralmente está ligada a um uso ineficiente.
Com base nas experiências e lições aprendidas pela UNIDO, durante dez anos de trabalho no Programa Global de Chemical Leasing, seus especialistas destacam o papel que modelos de negócios inovadores podem desempenhar para se alcançar um crescimento econômico inclusivo e sustentável, por contribuírem para a redução do consumo de produtos químicos, da produção de resíduos e do uso de recursos, sendo capazes de minimizar ou mesmo eliminar os riscos associados à gestão ineficiente de produtos químicos.
O Chemical Leasing constitui um novo modelo de negócios que visa trazer vantagens econômicas para todos os parceiros envolvidos com produtos químicos, por meio de soluções concretas para seu gerenciamento eficiente. No Chemical Leasing o sucesso econômico não depende do volume de produtos químicos vendidos, mas da qualidade e eficiência dos serviços prestados com a utilização dos produtos químicos.
Ao mudar o foco do aumento do volume de vendas de produtos químicos para uma abordagem de valor agregado, o sucesso econômico do fornecedor é transferido para a função e os benefícios do produto químico e não mais para sua quantidade. O consumo de produtos químicos torna-se um custo e não um fator de receita para o fornecedor. Os contratos de Chemical Leasing normalmente são centrados em unidades funcionais de pagamento, como o número de peças limpas, número de carros pintados, a área revestida, volume de água tratada, etc.
No Chemical Leasing entre um fabricante de tintas e um fabricante de carros é estabelecida uma parceria de longo prazo, onde as competências são associadas para pintar os carros com eficiência e eficácia. O fabricante de tintas passa a ser remunerado pelo número de carros pintados e pelo compartilhamento dos ganhos obtidos com a aplicação das Melhores Práticas de Sustentabilidade, economizando energia e reduzindo desperdícios.
O alinhamento dos incentivos comerciais resulta em interesse comum do fornecedor e do usuário a otimização do uso do produto químico, a fim de reduzir a quantidade consumida, o que consequentemente reduz os custos, diminui os riscos relacionados ao gerenciamento de produtos químicos e minimiza a exposição dos trabalhadores e o impacto negativo dos produtos químicos no ambiente.
O Chemical Leasing como instrumento de aplicação de práticas sustentáveis.
No artigo Exploring Green Chemistry, Sustainable Chemistry and innovative business models such as Chemical Leasing in the context of international policy discussions, publicado em 2016, Petra Schwager e Nils Decker, pesquisadores vinculados ao Programa Global de Chemical Leasing da UNIDO, afirmam que o conceito de Chemical Leasing, evitando o desperdício, adotando o uso de substâncias menos perigosas e introduzindo melhores processos de gerenciamento de produtos químicos, é totalmente congruente com os Doze Princípios da Química Verde e está alinhado com a Química Sustentável, a Economia Circular, os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e outras iniciativas na área de Segurança Química.
Fundamentados em um conjunto crescente de evidências consistentes que sugere a aplicabilidade da Química Verde, Química Sustentável, Economia Circular e outras Melhores Práticas de Sustentabilidade nas indústrias, por meio da implementação do Chemical Leasing, enfatizam os autores que isto pode gerar benefícios significativos nas dimensões econômica, ambiental e social, aos parceiros dos projetos, com redução dos impactos na saúde humana e no ambiente.
Newton Richa – Representante da UFRJ na Comissão Nacional de Segurança Química – CONASQ/MMA.